17 de março de 2015

Kassandra Roux

Kassandra Roux passou a maior parte de sua vida acreditando ser uma pessoa normal e de fato ela era. Filha de um simples casal, a garota nasceu com a pele branca, os cabelos castanhos e os olhos do mesmo tom. Era de uma beleza e graça delicadamente encantadora e não houve no mundo pessoa que não se apaixonasse por ela, quando pequena ou mesmo depois de crescida. Teve uma infância e adolescência normal, com amigos e família.
Agora, chegamos ao ponto em que tudo muda e no qual tudo em que a garota acredita simplesmente não faz o menor sentido.
Kass foi, desde muito cedo, uma garota estudiosa e apaixonada por mitologia. Sabia tudo de todos os deuses possíveis, era sua maior paixão... Aos quinze anos, ela se considerava quase uma especialista no assunto e achava que os sonhos estranhos que estava tendo eram apenas conseqüências das varias horas que passava estudando. Em seus sonhos, alguém a chamava e ela caminhava, em meio a um grande palácio como os que os egípcios construíram. Nos sonhos, ela era chamada por uma voz firme e grave, mas não lhe chamava por Kassandra e sim por Ísis. Não achava o fato estranho e sempre segui a voz por corredores e corredores. Quando Kass despertava estava cansada e exausta mentalmente, um pouco irritada e sem sombra de duvidas bastante confusa.
Por vários anos o sonho se repetia. Noite após noite ela se transformava em Ísis. Conforme o tempo passava, os detalhes do sonho se tornavam maiores. Ela era capaz de se ver envolvida em panos bonitos e antigos. Via-se também com a cobertura de Háthor, o sistro sagrado e o colar Menat. E conforme aquilo se repetia, ia ficando cada vez pior, cada vez mais real... Certa fez Kassandra, no sonho, estava sentada num grande trono, lindamente decorado com pedras preciosas. Vestia, como habitualmente, bonitos tecidos e a cobertura de Háthor, e em seus braços tinha uma pequena criança, um garoto ao qual amamentava cuidadosamente e observava os movimentos suaves. O trono ficava um lugar elevado, uma espécie de plataforma bastante alta. Aos seus pés ela via uma escada e lá em baixo passavam pessoas de um lado para outro, carregando grandes bandejas cheias de deliciosos petiscos, jarras de vinho e água, e vasos ornamentos com lindas flores. Todos os que passavam falavam uns com os outros em demótico. Aconteceria ali um grande banquete, uma festa em homenagem aquela criança que ela tinha nos braços e estava ali justamente para ver se tudo estava sendo arrumado adequadamente. Vez ou outra sua voz se elevará, alta e imponente, no mesmo estranho idioma que os outros falavam.
Naquela noite, quando acordou, ela sabia que a língua que estava falando no sonho, o demótico, era falada do antigo Egito. De alguma forma, ela entendia tudo que estava sendo dito e era capaz de reproduzir, com perfeição, todas as frases que pronunciou no sonho, mesmo sem nunca ter estudado apenas uma só palavra de demótico.
Kassandra acreditava, com todas suas forças, que aquilo iria passar. Que os sonhos iriam lhe abandonar e que ela iria ter novamente noites tranqüilas de sono. Mas, embora ela quisesse muito, não foi isso que aconteceu... Os sonhos se tornavam cada vez mais reais e os cenários variavam, sendo sempre parte do antigo Egito e na maioria das vezes lugares que ela nunca tinha ouvido falar, mas que no sonho via com tamanha riqueza de detalhes que era como se tivesse passado a vida inteira ali. Muitas vezes, inconscientemente, Kass se pegava um ‘tiet’ no canto de seus cadernos; além disso, costumava desenhar os cenários que via nos sonhos e a sua própria imagem, vestida de forma tipicamente egípcia.
No seu ultimo sonho ela se viu com um longo vestido, coroada com o hieróglifo cujo significado era troco. Caminhava nas margens do rio Nilo, com os pés tocando a água gelada. Em seus longos cabelos castanhos estavam trançados conforme era o costume, enfeitados com varias flores de lótus. Seus dedos deslizavam pelo colar Menat, até que novamente uma voz firme começou a chama-lo. Ora a chamava de Ísis, ora a chamava de mãe... Ela continuava caminhando, até que notou que vinha, em sua direção, um homem. Era alto, tinha os mesmos olhos num profundo tom de castanho, quase negro, os mesmos cabelos castanhos e o rosto fechado, decidido. Era forte, trajado segundo o costume e Kass descobriu, pela primeira vez, que era a voz dele lhe chamando. Soube também, no momento em que ficaram a poucos passos, que aquele era o bebê que ela tinha nos braços em outro sonho... O homem pegou as mãos dela e sorriu gentilmente para a garota, começando a falar. Embora o dialogo seguisse em demótico, ela entendia perfeitamente. – Ísis, minha senhora e mãe. – A voz dele era um sussurro firme. Kassandra subiu a mão ao rosto dele e deslizou o dedo pelo contorno de sua bochecha, mas não lhe respondeu. – Tentei fazer, minha senhora, que notasse sozinha quem realmente és. Lamento dizer que não tive sucesso, por isso, vim lhe contar... – Ele fez uma pausa, olhando-a fixamente enquanto esperava uma reação. Quando Kass continuou quieta, ele voltou a falar. – Sou Hórus. – Com aquela afirmação a menina finalmente se manifestou franzinho o cenho.  – O filho de Ísis. – A voz dela era incerta, quase como uma pergunta. – Seu filho, minha senhora. – Quando disse tal coisa, Hórus parecia calmo e confiante. Tão confiante que qualquer pessoa teria acreditado nele.

Naquele momento o sonho mudou. Agora, ela estava parada em uma sala deserta e o único objeto na sala era um enorme espelho. Quando olhava seu corpo, Kassandra se via normalmente, com os cabelos bagunçados, o corpo dentro de uma calça jeans e uma blusa manchada de tinta. Mas, ao seu olhar no espelho, ela via o reflexo dos sonhos, a imponente deusa Ísis com seu jeito confiante, a superioridade que lhe era natural e atrás dela seu filho, sorridente, ainda que a linha de seu sorriso fosse dura e rígida. – És, nessa vida, Kassandra. Mas foi, há muitos anos, minha mãe. A grande deusa Ísis, o modelo ideal de mãe e esposa... – Ele parou de falar por um segundo, como se estivesse esperando para ver se a garota não entraria em choque e foi nesse momento no qual ela começou a falar. – A protetora da natureza e da magia. Amiga dos escravos, pescadores e artesãos. – Agora ela já não parecia assustada. Olhava com atenção o espelho, lembrando-se do que era em sua outra vida, enquanto seu filho continuava a falar. – A deusa da maternidade e da fertilidade. – Naquele momento ele tocou o cabelo dela e desceu os dedos pelo seu colar Menat, que representava a fertilidade. Assim, ela completou os próprios títulos. – A deusa da simplicidade, protetora dos mortos e deusa das crianças. A filha de Geb e Nut. – Quando completou finalmente a frase, ela se virou de frente para ele. Hórus ofereceu a mão para sua mãe. – Por que agora, meu filho? – Era uma pergunta simples, a qual a resposta era ainda mais simples. – Porque apenas agora chegou o momento certo, minha senhora. Vamos agora? Temo que tenhamos assunto que a muito ficaram esperando. - Ísis sorriu e afirmou com a cabeça, dando a mão para seu filho e assim ela caminhou com ele, para fora da sala, que aos poucos voltava ao cenário do inicio, o antigo Egito. Novamente, caminhavam a beira do Nilo. 


Mellanie Thierry Roux

Middle
“Mellanie descia a colina rapidamente. O açoite estava preso ao pulso e a espada estava firme na mão direita. Ela parecia irritada, com os olhos estreitos e fixos no seu alvo. – PASSARINHO MALVADO! – Gritou, enquanto simplesmente tentava atingir a harpia, sem muita habilidade, com a espada.”
Hm, okay, acho que comecei a historia pelo lado errado. Esse não é nem o fim, pois tal coisa ainda é completamente desconhecida, mas tem algo que posso lhe contar: é o começo. Vamos a ele...

Offspring
O começo da historia que hoje conto não aconteceu com o nascimento de Mellanie, tão pouco no momento em que seu pai e sua mãe se conheceram. Essa é uma historia muito mais antiga.
Numa época remota, uma filha de Melinoe chamada Fleur Thierry conheceu, no acampamento, um charmoso filho de Thanatos chamado Scott Roux e foi assim que nasceu, anos mais tarde, Louis Thierry Roux, o pai da nossa protagonista.
Louis era uma criança diferente das outras. Por ser filho de dois semideuses, ele via algumas coisas que ninguém, além de seus pais, eram capazes de entender. Embora essas coisas nunca tenham lhe feito mal de verdade, isso foi fazendo com que Louis se tornasse uma criança estranha e solitária. Ninguém acreditava no que ele dizia e as escolas que frequentava por vezes ligavam para seus pais, pedindo que os mesmo fossem para lá para tirar Louis de dentro do armário depois de um surto de pânico ao ver algum tipo de monstro mitológico completamente incabível. 
Aos poucos tudo isso foi afastando Louis do mundo, até que ele simplesmente desistisse da faculdade. Com a morte de seus pais, o garoto se viu sozinho no mundo, sem ninguém que pudesse ajuda-lo ou entende-lo. Chateado e com uma herança bilionária, Louis construiu uma casa mais ou menos isolada de tudo, no meio de uma trilha complicada de uma grande floresta e deixou seu lado mais artístico florescer.
Passava horas pintando, escrevendo e compondo musicas. Agora, Louis era um lindo jovem de olhos claros e cabelos macios e também muito mais isolado do mundo. As coisas estranhas que era capaz de ver iam diminuindo, embora ele ainda achasse que fantasmas existiam e tentavam falar com ele.

Unexpected
Era uma agradável noite de primavera. A lua brilhava, solitária, no céu da meia noite e Louis estava inquieto na sua cama. Os barulhos que o vento produzia contra as janelas eram simplesmente perturbadores. Assim, o homem decidiu que continuar na cama era impossível e saiu para caminhar.
Lá fora, encontrou uma noite relativamente quente, com brisas suaves e alguns poucos animais produzindo ruídos aos quais ele já estava habituado. Começou a andar pela mesma trilha pela qual já havia passado centena de vezes; parecia decidido a chegar a algum lugar, embora caminhasse sem rumo, apenas tentando fazer com que o cansaço lhe ajudasse a dormir melhor.
De repente todos os barulhos da floresta pararam. Todos os animais ficaram mudos e parecia que até as arvores, e mesmo os rios, se recusavam a continuar produzindo qualquer tipo de ruído. Foi nesse momento que ELA surgiu em toda sua gloria. Do meio das arvores, caminhando lentamente, apareceu uma mulher bastante pálida, com cabelos loiros lhe caindo sobre os ombros em curvas bonitas e fazendo contraste ao vestido negro que a mesma usava.
Aquela mulher era encantadora, parecia brilhar numa suave aura prateada. Era como se a noite e a lua tivessem se unido para criar a criatura mais perfeita que já pousou os pés, descalços, sobre a terra... Louis ficou paralisado, simplesmente não sabia o que fazer. Ela era tão linda que parecia irreal com a maioria das coisas que ele via, mas não, ela não era irreal, apesar da beleza que possuía ser digna apenas das mais nobres deusas gregas.
Embora Louis estivesse com os cabelos bagunçados e com as típicas feições de uma noite mal dormida, a mulher lhe achou doce e encantador. Assim, se aproximou dele e lhe tocou a bochecha com carinho, deslizando o dedo indicador pelo contorno de seu rosto até parar sobre seu queixo. – Olá. – Ela sussurrou e naquele momento Louis jurou que mil anjos tinham cantado a mais doce melodia... Demorou algum tempo até que ele achasse as palavras. – Você é linda. – Sua voz era baixa e tímida. Obviamente ele não pensou no que disse, estava ocupado demais sentindo o perfume suave, e absolutamente divino, que ela tinha.
Imediatamente, a mulher soube que aquele não era um humano qualquer, mas também sabia que não era um semideus. Ainda sim, tinha algo de muito especial nos olhos dele que tanto pareciam com os seus e que lhe lembravam de alguém num passado distante. – Eu sou Mell. – Algo atraia a mulher e mesmo antes de partir, ela já pensava em voltar. – Louis. – O garoto sussurrou seu nome como se fosse a única palavra que se lembrasse... Mell então sorriu e se inclinou até dar um beijo suave na bochecha dele. – Até logo, Louis. – Murmurou, antes de correr para dentro da densa floresta.
Louis ficou ali, parado, até que perdesse a mulher de vista e então voltou, lentamente, para sua casa. Agora que estava mais calmo, ele conseguia dormir e chegou a pensar, na manhã seguinte, que tudo aquilo não foi mais do que um sonho. Ainda assim, não resistiu ao impulso que lhe tomou o coração durante a noite e logo que o relógio bateu meia-noite, ele voltou ao lugar onde tinha encontrado Mell. E ela estava lá novamente, parecia espera-lo satisfeita e seus olhos tinham um brilho tão puro que causariam inveja na mais bela das joias.
Assim foi, dia após dia. Um amor cultivado devagar, um amor delicado e certamente complicado, que foi crescendo. De beijos na bochecha passaram para mãos se tocando timidamente, a horas conversando sobre o mundo, a selinhos suaves, beijos ardentes e longas noites de amor que resultaram numa gravidez.
Quando Mell apareceu, quase um ano depois de conhecer Louis, para anunciar sua gravidez, o homem não acreditou. Era simplesmente bom demais para ser verdade. A mulher que ele amava esperava um filho seu... Com a felicidade, veio também a preocupação, afinal, se ela estava grávida não poderia ficar simplesmente correndo por aí a noite toda, tão pouco encontra-la apenas no meio da madrugada e vê-la partir antes do sol nascer. Louis pediu para que Mell fosse morar com ele, mas ela negou, disse que tinha muito trabalho para fazer e que jamais poderia deixar tudo àquilo para ‘viver o sonho perfeito’ ao lado de Louis, não importasse o quanto lhe amasse.
Por um tempo, o homem esqueceu o assunto, mas quando viu a barriga da amada começar a crescer, voltou a insistir naquilo e prometeu fazer qualquer coisa que ela quisesse. Melinoe acabou por ser convencida, mas impôs algumas condições. Primeiro, pediu que Louis construísse uma casa na parte mais tensa da floresta. Segundo, pediu que não fosse atrás dela quando ela precisasse sair e por ultimo, que aceitaria o destino da filha deles.
Louis, feliz como estava, aceitou tudo e providenciou para que as coisas ficassem prontas o mais rápido possível. Em menos de um mês a casa estava construída, cada coisa exatamente conforme a vontade de Mell, que finalmente revelou seu nome verdadeiro ao amado.

Fragile
Melinoe encontrou em Louis uma pessoa extremamente dedicada e amorosa, que fazia tudo que a deusa queria sem pestanejar e nunca questionava nenhuma decisão dela. Cada dia ao seu lado estava sendo perfeito, ela amava o homem e também amava, com todas as forças, a criança que trazia no ventre... Com o passar dos meses, Mell se viu em uma situação complicada. Sua filha nasceria em breve e Melinoe se encontrava no dilema entre colocar a vida da sua vida inteiramente nas mãos de Louis ou ficar ao lado de sua nova família e colocar a vida de sua filha em grande perigo.
Depois de medir cada opção Mell concluiu que nenhum dos filhos ou filhas que ela deixou aos cuidados dos pais tiveram um futuro bom, ou fácil. Lembrou-se, com grande pesar, de todos os filhos que perderá para monstros, e lembrou, com um pesar maior ainda, todas as coisas importantes que perdeu quando estava longe de seus filhos. Embora desejasse, bravamente, ser uma mãe em tempo integral, ela sabia que isso era impossível. Por outro lado não abandonaria sua filha por nada nesse mundo. Decidiu que passaria apenas uma hora por noite com sua filha. Era tempo o suficiente para dar um pouco de amor a ela, sem levantar suspeitas demais.

Only Exception
Era uma noite silenciosa quando Melinoe deu a luz. A criança veio ao mundo na mais completa paz e não chegou a chorar, apenas a emitir um som suave do protesto contra as mãos geladas de seu pai em contato com seu corpo pequeno e quentinho.
Quando pegou a criança no colo pela primeira vez, Melinoe soube que estava fazendo a coisa certa ao decidir não sumir da vida da menina. Sentia-se profundamente conectada aquela criaturinha rosada que tinha nos braços e decidiu chama-la de Mellanie.
Louis aceitou a decisão da amada, embora não sem relutar. Ele passava os dias cuidando de Mellanie e só ia dormir depois que Melinoe aparecia para ver a filha. Felizmente, Mellanie tinha o gênio suave do pai, era uma criança maleável, curiosa e muito obediente.
Por alguns anos, não questionou o motivo de sua mãe só aparecer uma hora por noite, mas conforme ia crescendo, isso começava a lhe parecer algo um tanto incomum... Quando começou a ir pra escola, os primeiros problemas de realmente apareceram. Mellanie, embora muito inteligente e com facilidade para artes num geral, não conseguia ler muito bem e enquanto as outras crianças já estavam no ‘F’, ela permanecia tentando entender o ‘B’. Além disso, começou a estranhar o fato de todas as crianças em sua volta terem a mãe por perto. Mães levavam e buscavam na escola, e iam as peças de teatro e aos recitais de musica, e até mesmo aos de poesias que Mellanie odiava; mas sua mãe não, sua mãe não estava lá.
Embora não fosse uma menina difícil de conviver, Mellanie começou a fazer perguntas e a desenvolver um tipo especial de antipatia por todo o mistério que girava em torno de sua mãe. Ainda sim, ela não era do tipo rebelde, que quebrava as coisas e jogava tudo pro alto, estava mais pra alguém chateada por não ter a mãe perto, mesmo tendo o melhor pai do mundo.
Conforme os anos passavam, Mellanie se tornava uma linda adolescente. Tinha lindos cabelos loiros e olhos que iam do mel ao verde. Mas era estranha, como o pai. Era quieta, tímida e muitas vezes, excluída. Embora as pessoas que lhe conhecessem fossem capazes de lhe achar a melhor pessoa do mundo, era preciso muita paciência e talvez até certa dose de loucura para entender o universo próprio dentro do qual Mellanie agia com graciosidade.

Beginning
A lua estava cheia, o único ponto de luz num céu completamente negro. As lamparinas estavam acessas na casa, Mellanie estava no sofá, as pernas cruzadas como índio, o corpo inclinado sobre o caderno grande, o lápis deslizando rapidamente sobre a folha em branco. No cômodo ao lado Louis arrumava, metodicamente, todas as coisas da filha e as colocava com cuidado nas malas que havia separado para tal coisa. Sobre a mesa da cozinha havia um simples bolo de chocolate, com morangos decorando-o e uma vela de quinze anos intacta.
Quando o som suave de uma batida na morta se fez presente, Mellanie levantou num pulo rápido, enfiando os pés de qualquer jeito dentro do all star. Caminhou até a porta e abriu a mesma, sorrindo ao encontrar a figura de sua mãe. – Oi. – Sussurrou. No mesmo momento, Melinoe praticamente se jogou contra a filha, envolvendo os braços no corpo da menina com urgência. – Feliz aniversario, minha pequena. – Melinoe se afastou do corpo da menina devagar, esticando-lhe a caixa lilás que trazia nas mãos. Mellanie pegou a caixa enquanto se afastava para sua mãe poder entrar. – Obrigada. – Murmurou, fechando a porta.
Louis saiu do quarto, puxando as duas grandes malas para a sala. – Oi, amor. – Sussurrou o homem, apaixonado como sempre, enquanto roubava um selinho rápido de sua amada, que parecia permanecer longe como no dia em que se conheceram. Melinoe nunca foi capaz de entender como Louis continuava lhe amando, mas a verdade era que ela também ainda amava ele e não recusou o beijo. – Está tudo pronto? – Perguntou, enquanto observava Mellanie caminhando para a cozinha. Louis apenas afirmou com a cabeça e os dois foram para junto da menina.
Sentaram-se, os três, em volta da pequena mesa e acenderam a vela. Quando Mellanie apagou a vela, desejou que sua mãe fosse mais presente em sua vida... Por um momento, o silencio permaneceu no cômodo, conformando um incomodo palpável em todos ali. – Por que não abre o presente enquanto seu pai corta o bolo, pequena? – Melinoe tentou quebrar o assunto, realmente ansiosa pela reação da filha que por sua vez apenas afirmou com a cabeça.
Enquanto Louis cortava o bolo, Mellanie puxou a caixa de presente para junto de si e abriu a mesma, franzindo o nariz para o que encontrou dentro dela. Era um pequeno anel prateado com um “G”, e algo muito parecido com uma tatuagem de hena. Mell levantou os olhos para sua mãe, franzindo o nariz, sem querer parecer rude. Melinoe deu um riso suave e se aproximou de sua filha. – É um presente mágico, diferente dos outros. – Murmurou apenas para ver os olhos da filha brilhando de animação. Melinoe ‘colocou’ a tatuagem em forma de serpente nas costas da mão esquerda da menina, deixando que ela envolvesse parte de seu pulso. Em seguida, encaixou o anel no dedo indicador da mão direita e ficou, por um momento, absorvendo tudo aquilo.
Mellanie parecia intrigada com os presentes, aos olhos dela, não tinha nada de mágico.  – O que eles fazem de mágico, afinal? – Sussurrou, aproximando a mão do rosto para alisar a tatuagem que parecia muito real. Melinoe negou com a cabeça, bem humorada como só ela sabia ser. – Lá fora eu te mostro, agora coma seu bolo que teremos que ir logo. – Mesmo que estivesse curiosa, Mellanie decidiu não questionar e comeu, com bastante satisfação, o bolo delicioso que seu pai havia feito.
Depois de comer, os três saíram da casa, caminhavam lentamente pela floresta, se afastando passo após passo. Estavam a uns cinco metros de distancia da casa quando algo estranho surgiu. Não era exatamente um zumbi, nem um esqueleto, mas algo entre os dois, que em baixo da pouca luz da lua parecia simplesmente uma coisa. Mellanie parou de caminhar, franzindo o nariz quando viu surgir uma espada na mão direita e um chicote na esquerda. A menina se virou na direção que sua mãe, que estava um pouco mais atrás, visivelmente confusa com o aparecimento das armas. – Mellanie, cuidado. – Quando se virou novamente, a menina encontrou a face do monstro a poucos centímetros da sua e não teve tempo para pensar, simplesmente se jogou para o lado, desviando do bicho e passou a correr para perto de seus pais.
Quando Mellanie finalmente conseguiu chegar perto de seus pais, os três estavam cercados daquelas coisas. Melinoe parecia muito irritada com tudo aquilo. – Como ousam??! – Gritou a deusa, muito indignada com aquela situação. A verdade é que não importava o quanto ela ficasse brava, ela não tinha real poder sobre aquelas coisas. Era deusa dos fantasmas, não dos ‘meio zumbis – meio esqueletos’. – Fechem os olhos. – Melinoe murmurou. Mellanie e Louis se abraçaram, com os olhos fechados e a deusa, severamente irritada, cuidou dos monstros. Mellanie não entendia o que sua mãe tinha feito, apenas sentiu um calor agradável e uma luz que lhe invadia mesmo com os olhos apertados.
A floresta voltou ao silencio habitual. – Está tudo bem. – Sussurrou, e um segundo depois que Mellanie abriu os olhos, um som estridente encheu a floresta. Pouco tempo depois um taxi de aparência, no mínimo, suspeita, apareceu no meio da floresta. – Mãe, o que está acontecendo? – Mellanie estava entre o desespero e a confusão completa e embora o tom da sua voz revelasse isso, seu rosto permanecia sereno.
Melinoe abriu rapidamente a porta traseira do carro e colocou as malas da filha ali, então lhe abraçou com carinho e deixou que Louis se aproximasse para fazer o mesmo. – Essas senhoras vão te levar até o acampamento. Eu iria te explicar no caminho, mas não deu tempo. Tem uma carta no bolso da mala, leia no trajeto. O carro balança bastante, mas é seguro. Nós vamos ficar bem, pequena, agora vá, por favor. – Melinoe tentou falar devagar, mas estava preocupada. Mellanie, boa menina como sempre, se enfiou dentro do carro enquanto sua mãe conversava, num tom muito sério, com as motoristas. Logo que a deusa se afastou, o taxi partiu em alta velocidade, fazendo com que a semideusa apertasse as mãos sobre o banco.
Embora achasse estranha toda a discussão das três mulheres no banco da frente, Mellanie usou toda sua educação e concentração para ignorar as mesmas. Passou toda a viagem, que nem foi tão longa, lendo e relendo a carta, tentando juntar os pontos. Escrito em grego antigo, as letras pareciam flutuar e se arrumar na sua frente para formar uma mensagem explicando o que era um semideus e contando quem Melinoe realmente era.
Quando o carro parou, em frente a grande colina, Mellanie já sabia o que fazer, sabia onde estava graças a carta. A menina tirou as malas do taxi e agradeceu. Diante da subida a sua frente, parecia desanimada. Não havia nada ali, ninguém para lhe ajudar com as duas enormes malas. Decidiu, então, subir uma de cada vez.

Middle
A loira subiu a colina em passos lentos, arrastando a mala com bastante esforço. Quando chegou ao topo, se permitiu cair sentada ao lado da mala, olhando para baixo, onde outra mala igualmente pesada lhe esperava. Suspirou e mordeu o lábio inferior, olhando o grande pinheiro e a entrada do acampamento. Queria poder largar a outra mala ali e ter ela depois dentro de seu quarto, mas saberia que não iria conseguir isso e por tal motivo se levantou, desanimada.
Seus passos eram lentos, estava no começo da descida, tomando cuidado com cada passo. – É, eu sei, Stacey. As pessoas são mesmo estranhas. – Sussurrou para o vento, conversando sozinha como geralmente fazia. Quando estava mais ou menos no meio da descida viu algo surgir próximo de sua mala, algo muito parecido com um pássaro gigante mutante. – NA MINHA MALA NÃO!! – Gritou, irritada, fazendo com que o monstro virasse a cabeça na direção da semideusa.
Mellanie descia a colina rapidamente. O açoite estava preso ao pulso e a espada estava firme na mão direita. Ela parecia irritada, com os olhos estreitos e fixos no seu alvo. – PASSARINHO MALVADO! – Gritou, enquanto simplesmente tentava atingir a harpia, sem muita habilidade, com a espada.





Francinne Bonimond

Flowers in your life.

Era o primeiro dia da primavera, a neve começava a derreter sob o brilho dourado do sol. Louis estava sentado num banco no alto da colina, olhando para baixo, observando lentamente conforme o manto branco de dissolvia para dar lugar novamente às flores que ele tanto gostava. O calor era bem-vindo em sua pele pálida, depois de um longo inverno, aquele era o momento pelo qual o homem havia esperado ansiosamente.
Em meio aos cantos suaves dos pássaros, ela surgiu. Louis não soube dizer ao certo em que momento ela apareceu, mas estava lá, subindo a colina com passos despreocupados, a mulher mais linda que ele já tinha visto. Seus longos cabelos negros caiam em cachos suaves até a cintura, entrando em contraste com sua pele clara. Ela usava um vestido verde-musgo que se agitava suavemente conforme seus passos e ao redor dela tudo parecia ganhar vida. Aquilo tudo parecia um sonho, mas se tivesse sonhando, Louis desejava não acordar.
A mulher terminou de subir a colina e se sentou no banco ao lado do mortal. Um cheiro doce de rosas invadiu Louis e ele não conseguiu deixar de sorrir quando se concentrou nos olhos da dama, os olhos mais lindos que ele já viu. Olhos que ele nunca foi capaz de descrever senão usando as palavras: ‘eles tinham a cor da primavera. ’
Foi amor a primeira vista e não tinha como ser diferente. Louis era um homem gentil, carinhoso e jovem. Toda sua atenção, pelos próximos seis meses, pertencia aquela mulher que subiu a colina, a mulher que se apresentou como Penny. Ela passava algumas horas do dia fora de casa, dizendo que iria visitar sua mãe e apesar de sentir-se vazio sem sua amada, Louis nunca questionou. Ele foi feliz com Penny, acompanhando, dia após dia, o crescimento de duas coisas extremamente preciosas. O amor e uma criança.
The little rose

Infelizmente, a primavera passou mais rápido do que ele gostaria, assim como o verão. Louis acreditava que sua amada esposa teria o nenê entre o outono e o inverno e aquilo não lhe agradava muito, pois não eram exatamente suas estações preferidas. Mas Louis estava cegamente enganado...
Aquele era o ultimo dia do verão. O sol brilhava intensamente, mas uma brisa gélida já se mostrava presente. As flores já não se abriam como antes e as folhas das arvores já começavam a ganhar os tons de laranja e marrom que anunciavam o outono. Penny estava sentada na cadeira de balanço, observando o jardim pela janela da sala, com ambas as mãos postas protetoramente sobre a barriga. — Eu não posso voltar para casa com você. Meu marido lhe mataria assim que tivesse chances... — Uma lágrima solitária e cristalina deslizou pela bochecha da mulher. Ela secou a mesma rapidamente e quase que no mesmo instante Louis atravessou o cômodo, trazendo na mão direita uma pequena sacola de pano cheia de diversos tipos de plantas. O homem caminhou até onde Penny estava e se ajoelhou aos pés dela, envolvendo-a com um abraço delicadamente colocando sua cabeça sobre a barriga dela. — Oi, nenê. O papai voltou. — Seus olhos brilhavam. Ele estava verdadeiramente feliz com sua esposa e a criança que logo chegaria para alegrar sua vida.
Penny não queria deixar tudo aquilo para trás. Ela amava Louis e também amava sua filha. Nunca antes havia sido tão feliz, mas sabia que não poderia continuar brincando de ‘família mortal’. — Você trouxe o que eu lhe pedi, querido? — A voz dela era suave. Louis afastou o corpo devagar e afirmou com a cabeça, entregando a sacola para a amada, que olhou atenciosamente o conteúdo da mesma enquanto o homem se levantava. — Obrigada, querido. Eu estava com tanta vontade de tomar esse chá. — Mentiu, engolindo a dor para proferir as palavras. Penny se levantou com cuidado e caminhou até a cozinha, onde preparou seu chá calmamente. Durante toda a manhã ela tomou grandes porções do chá, ansiosa para que fizesse efeito e realmente fez.
No meio da tarde Penny sentiu uma forte dor no seu abdômen e não evitou gritar, desesperadamente, por Louis. Ela sabia o que estava acontecendo, sabia que o chá tinha feito cumprido sua função e agora sentia as dores agonizantes do parto. De uma forma ou de outra todas essas dores lhe confortavam, sabia que agora teria como proteger seu amado bebê... Louis queria levá-la para ao hospital ou chamar algum medico para atendê-la em casa, mas Penny insistia que tudo faria bem desde que ele estivesse ao lado dela. As horas foram passando devagar e as dores aumentavam a cada minuto. Quando o céu já estava tingindo de púrpura pelo crepúsculo e quando Penny já tinha o corpo suado pelo esforço, ela nasceu.
Era uma garotinha linda, dos cabelos negros e a pele pálida, com suas bochechas rosadas. Chorava a plenos pulmões, com mais força do que Louis acreditava ser possível, mas ele estava tão fascinado com tudo aquilo. Penny envolveu a criança num pequeno cobertor e a trouxe para junto do peito, sorrindo. — É a garota mais linda que eu já vi. — Sua voz era um sussurro. Seu amado, ao ver a cena, sorria e chorava ao mesmo tempo. Sentia-se pleno, no tipo mais perfeito de felicidade que pode existir. Louis se sentou na beira da cama, olhando de perto o rosto pequeno de sua filha. — É a nossa Francinne, meu amor. — Penny sussurrou.
Durante as horas seguintes Louis se dedicou a arrumar o quarto, que tinha ficado um caos devido ao parto. Enquanto ele fazia isso, Penny aproveitada o contato com a filha e desde o nascimento não lhe soltou mais. Apesar de um parto difícil e prematuro, Fran e Penny pareciam bem... Por volta das 22h uma forte chuva começou, agitando os galhos das arvores de forma perturbadora. Raios e trovões cortavam o céu numa claridade espantosa e Penny lamentava, silenciosamente, o que aconteceria a seguir.
A mulher colocou sua filha para dormir no berço recém-montado e caminhou de volta para a sala, onde Louis estava sentada no sofá, contemplando o vaso na mesa de centro onde jazia uma única rosa branca, levemente murcha... Penny se aproximou dele, sentando-se ao seu lado. — Meu amor... — Ela sussurrou e perdeu toda a coragem quando viu aqueles lindos olhos verdes que ele tinha e o sorriso doce. A mulher suspirou e puxou Louis para beijá-lo. E naquele beijou ela colocou todo seu amor, toda a felicidade que tinha tido com ele e toda a dor que sentia por abandoná-lo. Ela separou seus lábios com relutância e juntou suas mãos as dele. — Louis, querido. Nós precisamos conversar, eu não sou exatamente como você pensa...  — Antes que ela terminasse de falar um forte trovão de vez presente e tamanho foi o estardalhaço que a pequena Fran acordou, aos berros. Louis se levantou sem pensar duas vezes e caminhou para o quarto.
Penny não tinha mais tempo, ela precisava ir embora naquele exato momento. Assim, ela deixou sobre a mesa de centro a carta que tinha escrito alguns dias antes, contendo as explicações necessárias e revelando tudo que ela poderia contar ao seu amado mortal. Trocou a flor branca do vaso, por uma rosa negra de perfume forte e doce. Ela passou pela porta para sentir a chuva gélida contra o corpo e antes de descer ao submundo, onde seu marido lhe esperava, Penny voltou a cabeça para a trás para contemplar Louis tentando acalmar Francinne, enquanto olhava, pasmo, as palavras na carta. E naquele momento Penny, ou melhor, Perséfone, jurou que não abandonaria sua filha e que seria tão presente quanto era possível ser quando se coloca uma semideusa no mundo.

The Sun and the Ghost

O tempo passou devagar e Louis se sentia incapaz de amar novamente. Ele se dedicava a cuidar de sua filha e via Francinne crescendo para se tornar uma mulher tão extraordinária quanto sua mãe. Todos os anos, na noite do aniversario da menina, pouco antes da meia-noite, uma rosa negra aparecia no vaso da sala, junto a um bilhete que, com palavras diversas, pedia desculpas pela ausência, desejava feliz aniversario, dizia que lhe amava e que nunca deixaria de lhe proteger mesmo de longe. O bilhete, sempre assinado por Penny, também costumava dizer o quanto ela lamentava por estar longe de Louis e o quanto ainda lhe amava.
Francinne cresceu feliz para se tornar uma pessoa maravilhosa. Tinha uma personalidade difícil em alguns momentos, às vezes era determinada e orgulhosa demais, exatamente como sua mãe, de quem também herdou o dom quase mágico de cuidar das plantas. Louis costumava definir sua filha como Lírio e Dama da noite. Dizia que quando estavam na primavera e verão ela era como um Lírio, pura, calma, doce e extremamente amável. Mas nos meses de outono e inverno a convivência se tornava mais difícil, tão difícil quanto cultivar uma Dama da noite...
Era o décimo sexto aniversario de Francinne, o céu estava sendo colorido pelos tons de púrpura e azul do crepúsculo que começava, exatamente como na noite de seu nascimento...  Perséfone achava que já estava na hora de contar para sua filha toda a verdade. Ao longo dos anos Fran tinha achado ver uma ou outra coisa estranha e sua mãe estava determinada a não deixar acontecer com sua filha o que acontecia com quase todos os semideuses. Perséfone não deixaria sua amada princesa se atacada por um monstro para conseguir chegar ao acampamento meio sangue se tivesse sorte. Não, ela não era esse tipo de mãe e ela mesma levaria sua filha para a segurança do acampamento.
A deusa bateu na porta da casa e esperou ansiosa para ser atendida. Sentia o coração batendo rápido e tentava manter a concentração na caixa que trazia entre as mãos, o presente de aniversario para sua filha... Quando a porta se abriu, Penny encarou uma moça de aproximadamente 1,70cm de altura, com a pele clara, os olhos verdes e cabelos que lhe caiam até a cintura em tons de rosa-pink. — Oi. — Francinne sussurrou numa voz melodiosa. Antes que a mulher pudesse responder algo, Louis apareceu atrás de Fran. — Quem é que... — Sua fala parou no exato momento em que ele viu Penny. Dezesseis anos depois e ela continuava a mesma... — Penny? — A voz de Louis era um sussurro fraco, mas Francinne ouviu e naquele exato momento ela sentiu a cabeça girando. — Eu posso entrar? — Perséfone murmurou meio tímida.
Francinne deu um passo para trás e abriu a porta completamente, permitindo a passagem. Penny entrou devagar, passando os olhos por todas as coisas que estavam exatamente como ela deixou. Virou-se então para Fran, mordendo o lábio inferior e esticando a pequena caixa que tinha nas mãos. — Feliz aniversario, minha rosa. — Francinne pegou a caixa com cuidado. Todas as rosas, todos os bilhetes passaram por sua mente como um flash e mesmo que ela quisesse, não conseguia ter raiva de sua mãe. A menina se sentou no braço do sofá e abriu a caixa com cuidado, para encontrar dentro da mesma um anel prateado e um bracelete do mesmo tom com flores tão perfeitamente desenhadas que pareciam reais. — Obrigada. — Fran sussurrou, enquanto colocava o anel na mão esquerda e o bracelete na direita. — Eles vão ter muito úteis quando você realmente precisar. — Penny sorriu.
Parado ao lado da porta Louis olhava para aquela cena. Notava o quanto Francinne de fato era parecida com sua mãe, o quanto elas tinham o mesmo olhar determinado e os mesmos lábios bem definidos. Perséfone passou as mãos carinhosamente pelos cabelos da filha. — Esse cabelo colorido fica lindo em você. — Fran sentiu o calor subir ao seu rosto e soube, imediatamente, que estava vermelha. — Obrigada... — Sussurrou. Louis notou, naquele momento, que Francinne não sabia mais o que fazer e resolveu interferir. — Nós estávamos prontos para cantar parabéns. Coma um pedaço de bolo com a gente, Penny. — Ele sorriu e começou a caminhar para a cozinha. Fran, animada, pegou na mão de sua mãe e simplesmente caminhou até a cozinha, quase que arrastando ela.
Francinne se colocou atrás da mesa, onde um bolo simples de chocolate estava posto. Eles cantaram parabéns e ela soprou as velas, desejando com todas as forças que tivesse mais contado com sua mãe agora que ela estava perto. Louis cortou pedaços de bolos e os três se sentaram ao redor da mesa para comer, como uma família, pela primeira vez. Penny, que tinha o menor pedaço, não demorou em terminar de comer. — Filha, eu vim te buscar para te levar a um lugar fantástico. É um acampamento... — Ela começou a explicar. Louis sabia que esse dia chegaria, sabia do que a mulher estava falando, já que ela tinha explicado na carta que deixou quando foi embora. — Eu vou deixar vocês conversarem. Volto logo. — Sussurrou Louis, se retirando para o quarto da filha.
Era de ser esperar que o homem tivesse magoa de Perséfone por tudo que aconteceu, mas não, ele não tinha. O amor que sentia por ela era tão grande que lhe impedia de se quer ficar chateado. Era claro que ele tinha desejado que ela estivesse ali para ver Fran crescendo, mas sabia que não era possível e pelo simples fato dela estar ali, naquele momento, ele já se sentia feliz... Enquanto Louis arrumava as malas da filha, a mesma tinha uma conversa animada com sua mãe, enquanto se deliciava com o bolo.
Francinne já estava no segundo pedaço de bolo e sua mãe estava simplesmente encantada com cada gesto gracioso da menina. — Que tipo de acampamento, mama? — Fran sussurrou entre uma garfada ou outra. “Mama’’; A palavra ecoou na mente de Penny, fazendo-a sorrir. Ela tinha medo que sua filha lhe odiasse, mas pelo jeito estava errada. — Um acampamento para pessoas especiais como você. Aonde vão te contar tudo que precisa saber e você ficará em segurança. — A idéia não era ruim, apesar de não fazer muito sentido da cabeça de uma adolescente. — Mas, e o papai? Ele vai ficar aqui sozinho? — Fran arqueou a sobrancelha para sua mãe. — Bom, querida... — Francinne simplesmente não deixou que Penny terminasse de falar.
Determinada, ela colocou seu bolo de lado para olhar, fixamente, para o rosto bonito de sua mãe. — Eu não vou a lugar algum sem meu pai! Você não pode chegar aqui e simplesmente me tirar dele! — Perséfone estava conhecendo um lado diferente da menina. Via, nos olhos da filha, a determinação que ela mesma tinha e aquilo lhe fez sorrir. Penny, por fim, afirmou com a cabeça. — Louis, querido. Arrume suas malas, porque parece que certa mocinha não via a lugar nenhum sem você. — Ela tinha um tom divertido, mas estava falando sério. Francinne adorou a idéia e se levantou rapidamente para caminhar ao quarto onde ajudava o pai a arrumar as coisas.
Enquanto fazia isso, Perséfone mergulhava na nostalgia daquela casa. Ela se levantou e caminhou para perto da lareira. Olhava, com atenção, as fotos espalhadas pela sala, todas mostrando diferentes momentos da vida de Francinne. Os bailes da escola que ela perdeu, os namorados com os quais ela não pode implicar. Penny desejava tanto poder ter cuidado da filha como deveria... A deusa estava com um quadro da filha nas mãos quando Fran e Louis atravessaram a sala com as malas nas mãos. Ambos encaravam aquilo apenas como férias e por isso haviam pegado apenas roupas e coisas essenciais, deixando todo o resto para trás. 
Saíram, os três, da casa e estavam caminhando em direção a rua, lentamente, quando o imóvel simplesmente explodiu numa grande bola de fogo. Onde estava a casa, agora existia um grande cão, mostrando sua boca raivosa cheia de dentes afiados. Seu pelo negro parecia reluzir na luz da lua cheia e seus olhos eram de um intenso tom de vermelho, como duas grandes e redondas pedras de âmbar. Perséfone levantou o olhar para o cão e amaldiçoou, com todas as suas forças, seu marido. — Francinne, entre no carro, agora! — Sua voz era firme, forte. Louis levantou, ajudando sua filha a fazer o mesmo. Na rua um taxi de aparência um tanto quanto suspeita esperava com as portas traseiras abertas. — MÃÃE! — Fran gritou quando ouviu o rosnado feroz do enorme cão.
Mesmo que esperneasse, Francinne não tinha força para lutar contra seu pai, que já tinha colocado as malas no carro e agora puxava a filha para dentro do mesmo com toda a sua força. — Está tudo bem, minha rosa. Vá! — As palavras não faziam o menor efeito na menina, ela continuava se debatendo nos braços fortes de seu pai... Louis conseguiu, com algum esforço, colocar a filha dentro do carro e fechar a porta. O taxi saiu em disparada, enquanto Francinne virava a cabeça para ser sua mãe brilhando numa intensa aura púrpura. Ela virou para o vazio e a ultima cena que teve foi o chão se abrindo para engolir o enorme cão junto a sua mãe.
Durante o resto da viagem Fran chorou no colo de seu pai até adormecer... Quando ela acordou o sol estava nascendo, colorindo o mundo com uma pálida luz dourada. O taxi tinha parado ao pé de uma colina e no alto da mesma era possível ver um pinheiro e uma espécie estranha de entrada em arco. A garota franziu o cenho e respirou fundo, olhando para seu pai. — Esse é o acampamento que sua mãe mencionou. É aqui que você vai se desenvolver e vai conhecer tudo que precisa sobre você mesma e sobre ela. — Louis segurou o rosto da filha delicadamente entre as mãos antes que ela pudesse começar suas reclamações. — Não se preocupe, ela está bem. No fim, todos nós vamos ficar bem. Eu vou te escrever assim que chegar no hotel, prometo. — Ele falava como se tivesse planejado esse momento a sua vida inteira, o que, de fato, tinha feito.
Francinne abraçou o pai com enorme carinho, afundando o rosto na curva de seu pescoço por um momento. — Eu te amo, pai. — Ela sussurrou antes de sair do carro puxando sua mala atrás de si. Louis colocou a cabeça para fora do carro pela janela. —Eu também de amo, pequena. E tenha fé, porque você é uma princesa. A filha de uma grande rainha. — Com essa ultima frase o taxi saiu dali em alta velocidade, deixando uma adolescente confusa e mentalmente cansada para trás.

Enquanto subia a colina ela tentava entender tudo o que tinha acontecido, passava todos os acontecimentos em sua cabeça devagar, tentando achar uma conexão que pudesse envolver e explicar tudo isso, mas nada fazia sentido e todos os seus pensamentos foram interrompidos pela visão do enorme acampamento abaixo da colina. Do topo da colina, onde ela estava, era possível ver uma grande casa, um conjunto de pequenos imóveis em uma formação estranha e adolescentes correndo para todos os lados. — Uma princesa. — Ela sussurrou para si mesma. Fran respirou fundo, juntou toda a coragem possível e deu o primeiro passo para descer a colina. O primeiro passo ruma a um futuro incerto pelo qual ela ansiava desesperadamente.


Athor and Serena

Quando o destino conta uma historia, você deve parar para ler.

Sei que você deve estar pensando “ Nossa, Dest, como você é clichê, copiando a ideia que a Morte teve quando escreveu ‘a menina que roubava livros’; Seja mais criativo. ’’; Mas, se minha esposa pode contar uma historia, o que me impede de fazer o mesmo? No fim das contas eu sou tão importante quanto ela, talvez até mais.
Essa é uma historia real, de um amor real, doce e extremamente complicado. Um amor tão puro quanto ao que tenho para com minha esposa.

Serena era uma garota sorridente, que estava sempre rodeada de pessoas, mas no fundo se sentia eternamente sozinha. Athor, por outro lado, era quieto e tímido, mas tinha grandes e verdadeiros amigos.
Por assim, sem querer, que juntei os dois. Eu não tinha intenção, na verdade, queria mantê-los quietos por um tempo depois de tantas desventuras, mas acabei de descuidando por um momento. Num momento, Serena oferecia balas de ursinho amarelas para Athor e no momento seguinte, ele queria ama-la para sempre.
Felizmente, ou infelizmente, Serena entendia o tamanho do sofrimento que poderia causar ao garoto. Ela nunca foi uma menina normal, tinha um dom especial para a dor, algo que geralmente saia de seu controle. Com uma facilidade descomunal ela se machucava e machucava os outros. Foi por esse motivo que a garota criou uma mascara e barreiras que pessoa alguma poderia transpor. Ela sorria o tempo todo, fazia as pessoas a sua volta rirem, dava conselhos bons, mas ninguém lhe conhecia realmente, ninguém sabia a dor que carregava e como se esforçava para manter o sorriso e os olhos gentis.
O primeiro pedido que ela fez ao garoto foi bem simples. “Não me ame”. Athor foi teimoso demais para atender o pedido dela, mas, sinceramente, eu não o culpo. Sempre fora um garoto bom, com um coração enorme e gentil. Serena chegou devagar, num momento difícil, oferecendo amor, carinho e cuidados ao coração tão maltratado do garoto. Qualquer um se apaixonaria.
Por um longo tempo eu temi que tivesse cometido um grande erro ao deixar os dois de aproximarem. Serena era incansável de vários modos. Ela tinha medo de amar o garoto, medo de machuca-lo, medo de não ser o suficiente, de não saber cuidar dele, mas principalmente, ela estava fisicamente longe... Talvez, por outro erro meu, ela deixou suas barreiras caírem e antes que pudesse evitar estava confessando seu amor a Athor.
Ainda que boa parte dos medos do garoto estivesse simplesmente se desfeito, as coisas não se tornariam mais simples agora que ela declarará seu amor. Muito pelo contrario... Apesar do amor ser correspondido, uma barreira muito grande ainda existia ali. Alias, varias barreiras ainda estavam ali.
Serena, embora amasse muito o namorado, ainda lhe escondia grandes segredos de sua vida. Escondia o passado complicado, as historias dolorosas, as cicatrizes na alma, no coração e no corpo. Quanto a Athor... Bom, eu não posso dizer com certeza, mas é provável que ele também esconda algumas coisas. Além disso, uma velha conhecida minha vivia assombrando a mente dos dois: a Carência.
De um jeito ou de outro, eles fizeram o melhor com aquilo que tinham nas mãos. Fizeram o melhor para provar seu amor, para fazer com que o outro se sentisse amado e desejado, mesmo de tão longe. Alguns dias depois do começo do namoro, eles traçaram planos, sonharam juntos e Serena lhe fez um pedido. Não o ultimo, mas o mais importante. “Me ame para sempre.”

O final dessa historia? Eu ainda não escrevi, afinal, sou o Destino e ainda tenho muito que fazer. Escrevo certo por linhas tortas, as vezes, extremamente tortas, mas garanto que seja como for, será um final feliz. Serena mantém o coração do amado bem guardado e cuidado, junto as suas roupas de Lolita, suas bonecas e seus livros. Athor, por sua vez, mantém o coração da namorada guardado no lugar mais importante que conseguiu entrar. Na mesma caixa onde estão suas alianças.


So... Beautiful

“Nossa loucura será a causa de nossa ruína.”

As palavras ecoavam devagar nos pensamentos daquela que era uma e nenhuma. Acomodada na cadeira de escritório, com os braços postos sobre os cotovelos na mesa de madeira, ela observava seu trabalho. Era uma bela peça, tinha que assumir.
Jean firmou os pés no chão e impulsionou a cadeira de forma a atravessar o cômodo, parando em frente a uma grande prateleira, cheia de discos e CD’s, que cobria toda a parede. – Loucura. – Murmurou, enquanto se levantava para observar os discos, passando os dedos sobre varias capas sem escolher nenhum em especial. – O que ele entende de loucura? – Puxou um dos discos, voltando a se sentar.
Novamente, deu um forte impulso na cadeira e deslizou para o outro lado da sala, onde o toca discos exibia toda sua antiga gloria... Com todo o cuidado possível, tirou o disco da capa e colocou no aparelho, posicionando em seguida a agulha em seu devido lugar. Em poucos momentos notas suaves encheram o cômodo e Jean sorriu de lado.
Voltou, devagar, ao lugar de origem. Estava, mais uma vez, parada em frente a mesa de madeira que ficava entre as duas paredes anteriormente descritas. A sua frente abria-se uma grande parede de vidro, lá em baixo, Monte Carlo brilhava em sua artificial luz noturna.  Atrás dela, encostada na ultima parede do cômodo, a certa distancia da porta, estava uma enorme cama de casal e pendurado sobre a cama, uma caixão de vidro. Algo muito parecido com uma múmia descansava ali dentro.
A mulher ainda observava sua obra, um rosto posto sobre um manequim branco que outrora não tinha expressão... Junto a melodia lenta que enchia o cômodo, chegou a voz.
Você está aí, Vibo?
Ela sorriu, um sorriso doce que contradizia completamente a expressão de predador feroz que seus olhos verdes demonstravam. – Estou, Paso. – Murmurou lentamente, girando na cadeira para observar o caixão. Mantém os olhos fixos no mesmo, sabendo que a conversa não terminou.
Por que demorou tanto? Me deixou aqui, sozinha no escuro enquanto se divertia por aí.
Jean revirou os olhos, irritada. Passou as mãos pelos longos cabelos rubros e mordeu o lábio inferior, abaixando a cabeça por um momento. – Eu não estava me divertindo, sabe disso. Tudo que faço, tudo que fiz, foi para você. – Sua voz era carregada de sentimentos que não deveriam caminhar juntos. Ela levantou a cabeça e suspirou, dando as costas aquela que lhe falava.
Eu sei disso, Vibo. Eu sei... Desculpe. Sinto muito, mas... O tempo não passa nunca quando você não está aqui.
Então, tão simples como veio, se foi. A raiva da mulher passava ao ouvir aquilo e uma ternura já conhecida se instala em seu coração. Lembranças retornam, fazendo-a sorrir novamente. – Tudo bem. Eu estou aqui agora, estamos juntas. Irei dormir ao seu lado agora, Paso.. E, além disso, eu trouxe um presente. – Sussurrou, passando os dedos lentamente por sua obra.
O que é, Vibo?
A impaciência e surpresa na voz faz o sorriso da ruiva se tornar mais largo. Ela caminha lentamente até a cama, subindo na mesma para ficar na altura do caixão suspenso por grossas correntes. Tubos e fios de todos os tipos estão ligados a caixa de vidro, de modo que o ar não entre ou saia dali sem que a ruiva assim deseje.
Por um momento o silencio se faz presente enquanto ela observa o corpo mumificado, imóvel ali. – Você vai amar. - Murmura enquanto desce da cama e volta para frente da mesa. Ali pega um controle e começa a apertar uma serie de botões. O caixão reage a cada toque dele.
Não vai me contar o que é, Vibo?
Devagar, o caixão vai descendo. É possível ouvir os tubos de ar fazendo uma serie de movimentos. – Você já vai ver. – A ruiva parece ansiosa. A musica para e ela nega com a cabeça, mordendo o lábio inferior. – Precisamos de musica. – Larga o controle, caminhando em passos apressados ao toca discos.
Não, Vibo. Depois, agora eu quero...
Impaciente, não deixa que a frase seja terminada. – Só um segundo, espere, Paso. – Sussurra conforme os dedos ágeis viram o disco e voltam a posicionar a agulha. A sala se enche com uma perfeita harmonia instrumental, sem mais vozes, como o momento pede. – Gosta dessa? – Pergunta, mesmo já sabendo a resposta.
Claro. Você sabe que eu sempre gostei. Agora me deixe ver o que trouxe para mim, estou curiosa.
Jean caminha de volta até a mesa, aperta um ultimo botão no controle e, enquanto ouve a tampa do caixão sendo levantada por correntes fortes, pega delicadamente sua obra. Agora ela caminha até a cama com um rosto em mãos. Literalmente, um rosto. A pele que antes deu expressão a uma linda modelo. Os buracos vazios onde deveriam estar seus olhos, os lábios cuidadosamente cortados, os cabelos tão brilhantes que ainda pareciam vivos.
Dessa vez a ruiva apenas se ajoelha na cama e ergue sua obra, exibindo-a ao corpo. – Aqui. O que achou? – Murmura, ansiosa e por um momento o silencio lhe violenta os pensamentos, mas a voz chega, como sempre chegou.
Oh, Vibo. É tão linda... É para mim?
A felicidade toma o lugar da ansiedade, seu coração se acelera. – Claro. Vou coloca agora mesmo. – Então ela se inclina para frente e começa o trabalho. Com extremo cuidado encaixa a abertura dos olhos aos do cadáver, então nariz com nariz e boca com boca. Coloca a mão sob a nuca, levantando-a devagar para encaixar a parte de trás da mascara. Por fim, aproxima as bordas de forma que não formem pregas.
Pronto? Eu já posso ver?
A voz é cheia de ansiedade. A ruiva dá um passo para trás, observa o conjunto e pula da cama, caminhando apressada para a mesa de madeira mais uma vez. – Calma, só falta uma coisa. – Tira de uma das gavetas um pente e um espelho. Volta rapidamente para a cama e arruma os cabelos negros que pertenciam a outra pessoa. Por fim, coloca o espelho a altura do rosto da múmia e sorri.
É linda... Agora eu estou bonita também, Vibo. Agora eu tenho um rosto, como todo mundo.
Tais palavras fazem uma solitária lágrima rolar a face rosada daquela que é uma e nenhuma. Ela afirma com a cabeça. – Você está perfeita. – Murmura, enquanto passa os dedos lentamente sobre o rosto novo do cadáver... Jean se levanta e por um momento o peso do mundo parece cair sobre seus ombros. Seus passos são lentos até a mesa, onde deixa o pente e o espelho, e pega o controle.
Para aos pés da cama e começa a apertar botões. A tampa de fecha sem ruídos, mas é possível ouvir o ar girando dentro da caixa, sendo extraído da mesma e levado para longe dali. Devagar, o caixão começa a subir para sua posição original, enquanto isso, Jean se acomoda em sua cama, puxando os lençóis para sobre o corpo e abraçando o travesseiro.
Um click surdo, a musica para, o disco acabou. Jean corre os dedos sobre o controle, aperta um botão e uma grossa camada, como uma cortina de ferro começa a se colocar sobre a parede de vidro que antes mostrava as luzes noturnas de uma cidade que, infelizmente, raramente dorme. A ruiva bate palmas, as luzes fluorescentes do quarto se apagam e ela suspira.
Boa noite, Vibo.
O sorriso é inevitável. O quarto está escuro, exceto pelas luzes dos aparelhos, pequenos focos vermelhos e verdes, furtivos como olhos de gato num cemitério. – Boa noite, Paso. –Sussurrou.
No silencio do tumulo, a mulher viva desliza para um sono sem sonhos como o sono dos mortos.